quarta-feira, setembro 12, 2007

CORPO VAGO

Vou deixar cair da boca palavras, tantas quantas me lembrar. E sem filtros nem pudores, nem esperar pela censura que me pode calar de medo, vou chamá-La aos gritos. Vou choramingar-lhe no ombro sempre que não me sentir. Preciso que ela me morda as entranhas e me arranque do tédio que é o dia em que não penso. Sou de mil amores mal amados, derrotado em todas as batalhas, ex-protagonista de contos de fadas e historias de encantar. E para sugar a vida, preciso da dor do pecado. Preciso da lamúria e do arrependimento, do perdão expresso por gestos meigos que me façam sentir querido. Sinto que nem criança que chora por querer mamar. Preciso do fundo do poço para ir ao cimo da vida e novamente sugar. Sou constantemente inconstante. Choro de tanto me rir e rio de tanto me doer quando choro. Vou viciando tudo o que toco porque é assim que quero – “diz antes assim! Não digas dessa forma porque eu não gosto.” Sou o filho pródigo que volta sempre a casa, mas nunca à sua, porque tremo só de pensar que já não me recebem numa corrida de boas vindas. Espero que me queiras sempre nos teus caracóis e nessa pele rosada. Acredita que sou só humano. Sou tão só humano que me esqueço que sinto. (E sinto tanto.) Vou deixar cair da boca palavras, tantas quantas me lembrar. Vou dizer que quero casar-te comigo e jurar-te constantemente constância. Sou assim quase humano porque tenho na voz da citara o amargo do fel e no fado da vida um feitiço que me consome a carne do corpo e só me atira ao chão.